segunda-feira, 4 de maio de 2015

Do Monte Novo a Aljustrel, passando por Beja, Évora e Lisboa


A minha Mãe nasceu em 1914, no Monte Novo, algures num triângulo com as aldeias da Conceição e Alcarias no concelho de Ourique, a uma légua de Messejana. Pelo menos até ao exílio em 1965, não havia estrada decente que permitisse o acesso por automóvel. No Inverno os automóveis tinham de ser desatascados por parelhas de mulas e, quando havia enxurradas, o monte ficava pura e simplesmente isolado.

A instrução primária fê-la na escola primária da Conceição. Depois e de entre os noves irmãos, vai fazer o quinto ano (classe, como então se dizia) para o Liceu de Beja. Seguem-se o sexto e sétimo em Évora e a licenciatura em germânicas na faculdade de Lisboa (guardo o canudo!). Naquele tempo, uma gaiata de dez anos sair do monte e fazer este percurso diz muito sobre a pessoa que era e veio a ser.

No início da década de 1950, gente boa de Aljustrel ajuda os meus pais e o Francisco Serrano Gordo a criar um externato de que passou a ser directora. Hoje ninguém percebe o que representou para cerca de vinte a trinta jovens por ano poderem completar o então Segundo Ciclo do Ensino Secundário – o actual nono ano era então um privilégio.

Nestes dias, recordo dois factos singelos. Era bom aluno e no segundo ano tive média de dezassete, com direito a prémio nacional. Apesar deste perfil, pelos meus catorze anos a sua maior preocupação era incutir-me hábitos de trabalho.

Foi minha professora de inglês, quase sempre me deu catorze e nunca mais do que catorze. Fartei-me de barafustar, mas no exame nacional do quinto ano tive média de desaseis … com catorze a inglês. A avaliação que fazia do filho era justa!

Dá para perceber que entre Mãe e filho sempre houve um grande amor, mas sem excessivas manifestações exteriores a que estamos habituados. Hoje recordo o percurso da ‘menina’ do monte isolado que singrou em Beja, Évora, Lisboa e se se impôs a gerações de jovens de Aljustrel e arredores. E o que me vem ao espírito é a justiça da sua avaliação e o legado em hábitos de trabalho. Parece estranho, mas não é. Talvez seja diferente.

A foto é do Liceu de Évora e a minha Mãe é a segunda, na primeira fila, a contar da direita.

 
Lisboa 4 de Maio de 2015

Sérgio Palma Brito

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